sábado, 7 de dezembro de 2013

Vírus — como um fator não vivo pode ser considerado componente biótico

    A princípio,  definir estes dois fatores principais  dos ecossistemas parece ser uma tarefa fácil. Para tanto, fazemos a pergunta: "É vivo ou não é?" Se a resposta for positiva, biótico, caso contrário, abiótico. Simples. Ou quase.
      As complicações começam a surgir quando o conceito de algo passa a se tornar uma discussão prolongada e que homens de várias eras já acabaram por ficar longos períodos discutindo sobre o assunto sem conseguir respostas definitivas. "Quem somos?", "Para onde vamos?", "De onde viemos", "Quem é o pai?" — nada disso. Estou falando do conceito de vida. Do filosófico? — também não. Biológico mesmo. Ah, mas isso é fácil, qualquer um pode cutucar algo e ver se geme. Calma. Existem criaturinhas que desafiam os conceitos tradicionais da definição de vida mesmo que do ponto de vista biológico. Além de passar longos períodos cristalizados como um sal qualquer, nosso desafiante também exerce intensa atividade biológica quando infecta células de outros seres vivos para se reproduzir. Senhoras e senhores, apresento-lhes os vírus! (Não os de computador, claro).

         Vírus são... são... são criaturinhas intrigantes. A maior discussão sobre eles gira em torno se estes agentes, fatores, partículas proteicas, infecciosas, parasitas intracelulares podem ou não serem considerados seres vivos. Isto dependerá diretamente da definição de vida utilizada. Para isto é necessário analisar alguns aspectos que os seres vivos devem apresentar.
       Vamos por partes: eles possuem DNA e/ou RNA (Sim, eu sei, leia a referência. A parte do e não se refere apenas material genômico) ok; fazem partes de linhagens contínuas; se reproduzem e evoluem conforme o ambiente, certo. O problema é que eles não são constituídos por uma estrutura fundamental a todos os seres que queiram ser considerados vivos — célula. Não possuir "a menor porção de matéria viva" acaba por derrubar a maioria dos argumentos que ainda tentam animar nossos pedaços proteicos ambulantes preferidos. 

         
     Esta discussão se esquenta ainda mais quando surge a necessidade de conceituar o que são componentes bióticos. Este conceito já foi discutido um pouco aqui no blog, mas para este ensaio será necessário trabalhar pouco mais o termo.
        O conceito.de definiu biótico como tudo aquilo que se refere ao que "é característico dos seres vivos ou que está vinculado a estes. Também é aquilo pertencente ou relativo à biota.(...) Incluem todos os seres/organismos vivos, sejam eles animais, plantas, bactérias, etc., os produtos dos mesmos." O trecho "está vinculado a estes" pode sugerir a inclusão dos vírus neste conceito?
      Robina Sharma, quando escreve sobre os fatores bióticos que operam em um ecossistema diz que plânctons, vírus e bactérias são organismos bióticos vitais, tal como animais e plantas, naturalmente. A contradição se encontra nos fato de ela ter definido que fatores bióticos são todas as coisas que são consideradas vivas, como animais plantas e árvores; bem como materiais que eles produzem diretamente, como resíduos diversos ou folhas caídas. Vírus não são "produzidos" pelos seres vivos, deixando-nos com algumas dúvidas: ou ela considerou os vírus como seres vivos ou que a interação direta com as células dos seres vivos já pode ser considerado como um fator biótico.
     Ao longo do texto ela cita que vírus podem espalhar doenças nos ecossistemas e que possuem o potencial de causar seu desequilíbrio. Isto nos indica que os impactos que os vírus fazem nos seres vivos já podem ser suficientes para classificá-los como componentes bióticos. O problema é que o fim do texto ela expõe de forma explícita que os fatores bíóticos de um ecossistemas são as partes vivas. "Biotic factors are the living parts of an ecosystem, and how they operate and affect other organisms depends on what type of organism it is. Ela cita como exemplos os predadores, parasitas, presas, produtores, simbiontes e concorrentes. Em qual destes os vírus se enquadram?
       Outra maneira de tentar responder a pergunta título é pelo método da exclusão. Michael O. Smather quando cita os dois principais componentes de um ecossistema fala que os componentes abióticos consistem nos aspectos inorgânicos de um certo ambiente e que são eles que definem qual serão as formas de vida que sobreviverão em tal local. Sabemos que os vírus são compostos principalmente de uma pequena quantidade de ácido nucleico inserido em uma espécie de cápsula proteica. Também sabemos que o DNA/RNA são compostos orgânicos, bem como as proteínas. Sob este aspecto, podemos seguramente afirmar que os vírus não fazem parte dos fatores abióticos.
         Na tentativa de responder à pergunta título, será feita uma análise de combinações de definições e em quais destas podemos classificá-los como bióticos ou abióticos.

Primeira hipótese: Utilizamos o conceito de vida que diz que o organismo não precisa de organização celular para fazer parte do que é vivo e, desta forma consideramos os vírus como seres vivos e sem problemas classificamo-os como componente biótico.

Segunda hipótese: Consideramos os vírus com não vivos mas que para ser considerado um componente biótico, basta ter relação direta com os organismos vivos, e para ser considerado um fator abiótico a substância deve apresentar características inorgânicas. Assim, também os classificamos como componente biótico.

Terceira hipótese: Novamente consideramos os vírus como agentes não vivos e adicionamos que esta característica também deva ser verdadeira para todo e qualquer componente para ser classificado como biótico. Como os vírus não se incluem nesta definição, eles sevem ser considerados como fatores abióticos.

Análise das hipóteses:
     Colocando em xeque as hipóteses, conclui-se que não podemos considerar a primeira, uma vez que ela viola claramente o conceito de vida adotado no início do texto.
      Na terceira hipótese, é violado o conceito de que para ser abiótico o fator deve ser inorgânico (no caso das substâncias, claro). Vimos que os vírus não sustentam esta premissa.
      Contudo, a segunda hipótese não violará nenhum conceito-chave se para ser considerado fator biótico pois sua definição abrange todos os componentes que estão diretamente vinculados ao meio biota.

Conclusão:
     É visto na análise das hipóteses que a segunda pode ser considerada se violar nenhum dos conceitos-chave apresentados anteriormente. Logo, os vírus são considerados fatores bióticos. Além disso, vale salientar que eles possuem características muito mais semelhantes aos outros seres vivos em geral se comparadas às dos fatores abióticos.

Independentemente do conceito utilizado, o fato é que os vírus adoram pular a tênue linha que divide uma das definições mais complexas de se conceituar ao longo da história e que até hoje causa discórdia até mesmo entre os mais estudiosos no assunto.

Por favor, comente a sua opinião/crítica ao texto; ou se tiver, melhor ainda, outros textos/artigos que discutam sobre este assunto, pois não achei nenhuma referência que tratasse diretamente da questão abordada no texto. 
Grato.

3 comentários:

  1. Excelente o post! Engraçado, e com uma otima linha de pensamento. "Agregou valor" ao blog!

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  2. Muito bom o texto, conseguir tirar minha duvida.

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